quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Enfim, a FÓRMULA DE DEUS

Fique atento: O português desse texto está escrito no português de Portugal.


Tomás apontou para a palavra no topo da folha com a chave.

"Está a ver este nome?"

"Alberti?"

"Sim."

"O que tem ele?"

"É uma idéia inteligente, sabe? Einstein brincou aqui com o seu nome próprio, Albert. Um leigo que veja isto pensa que se trata de uma mera referência italianizada ao seu nome, mas um criptanalista logo percebe que está perante algo bem diferente."

"Ah, sim? O quê?"

"Leon Battista Alberti era um polímata florentino do século XV. Foi uma destacada figura do Renascimento italiano, uma espécie de Leonardo da Vinci em escala pequena, está a ver? Era filósofo, compositor, poeta, arquiteto e pintor, autor da primeira análise científica da perspectiva, mas também de um tratado, veja só, sobre a mosca doméstica." Sorriu. "Foi ele quem concebeu a primeira Fonte Trevi de Roma."

Greg abanou a cabeça e curvou os lábios.

"Nunca ouvi falar."

"Não é importante", disse o criptanalista com um gesto vago. "Um dia, Alberti andava a passear pelos jardins do Vaticano quando encontrou um seu amigo que trabalhava para o Papa. A conversa informal abordou alguns pontos interessantes da criptografia e encorajou Alberti a preparar um ensaio sobre o assunto. Entusiasmado, Alberti propôs uma nova forma de cifra. A sua idéia era utilizar dois alfabetos de cifra, cada letra alternando entre um e outro alfabeto, de modo a confundir os criptanalistas. Foi uma idéia genial, uma vez que implicava que a mesma letra do texto simples não aparecia necessariamente como a mesma letra no alfabeto da cifra, o que dificultava a decifração."

"Não estou a perceber."

Tomás ajeitou a folha com a chave e apontou para as linhas com os alfabetos.

"É fácil", disse. "Na primeira linha encontra-se o alfabeto simples, não é? As duas linhas de baixo são as dos alfabetos de cifra. Imagine que eu quero escrever aacc. A letra do primeiro alfabeto de cifra correspondente ao a é o f e ao c é o b, não é? E no segundo alfabeto de cifra são, respectivamente, as letras g e x. Então, a mensagem aacc, quando cifrada através deste sistema, fica fgbx, está a ver? Alternando-se a mensagem original entre os dois alfabetos, não há repetição de letras, o que dificulta a decifração."

"Ah, entendi."

"O que Einstein nos deu foi a informação de que tinha usado uma cifra de Alberti e mostrou-nos quais as duas sequências corretas dos alfabetos de cifra."

Greg apontou para a segunda linha da mensagem cifrada.

"Se utilizarmos esse método, saberemos qual a mensagem ocultada por este !ya ovqo?"

"Sim, em princípio sim."

"Então do que estamos à espera? Let's do it, pal!"

Tomás pegou na caneta e comparou cada letra aos alfabetos de cifra.

"Ora bem, vamos lá a ver o que significa este !ya ovqo." Suspirou. "O y do primeiro alfabeto de cifra corresponde a um i e o a no segundo alfabeto de cifra corresponde a um l." Rabiscou as letras. "Hmm... o o dá r e o v dá s. O q é um v e o o é um b."

A frase emergiu no papel.


!il rrsvb



"Não estou a perceber", disse Greg, carregando as sobrancelhas. "Il rsvb”? Mas o que é isto?"

"É a mensagem original cifrada por Einstein", explicou Tomás.

O americano ergueu os olhos e mirou-o com uma expressão interrogativa.

"Mas isto não significa nada..."

"Pois não."

"E então?"

"E então, temos de prosseguir a decifração, não acha?"

"Prosseguir a decifração? Como assim? Isto não está decifrado?"

"É evidente que não", exclamou Tomás. "Como você constatou, il rsvb não significa nada. O que quer dizer que apenas cumprimos um passo da decifração."

"Há mais passos, é?"

"Claro que há." Apontou para a última palavra rabiscada por baixo das linhas com os alfabetos. "Está a ver este nome aqui?"

"Sim. O que tem?"

"Consegue ler?"

Greg inclinou-se sobre o papel.

"At... uh... atbart?"

"Atbash."

"Atbask", repetiu o americano. "O que é isso?"

"O atbask é uma forma tradicional de cifra de substituição hebraica, utilizada para ocultar significados no Antigo Testamento. A idéia é pegar numa letra que está, por exemplo, a três lugares do início do alfabeto e substituí-la pela letra correspondente a três lugares do fim do alfabeto. Assim o c torna-se x, não é? A terceira letra a contar do princípio é substituída pela terceira do fim, e assim sucessivamente."

"Estou a entender."

"Há vários exemplos de atbasb no Antigo Testamento. Em Jeremias aparece por vezes a palavra chechac, começando por duas letras hebraicas shin e por um kaph. Ora, o shin é a penúltima letra do alfabeto hebraico. Substituindo-a pela segunda do alfabeto ficamos com beth. Kaph é a décima segunda letra a contar do fim, pelo que vamos substituí-la pela décima segunda letra a contar do princípio, o lamed. Portanto, o shinshinkaph, que dá chechac, torna-se beth-beth-lamed. Babel. Chechac quer dizer Babel. Entendeu?"

"Sim, é engenhoso."

"Engenhoso e simples."

"Einstein utilizou atbash nesta sua cifra?"

"É o que diz a anotação, não é? Repare. Alberti significa, como é óbvio, a cifra de Alberti, com os correspondentes alfabetos de cifra. Atbash significa que temos agora de procurar as letras simétricas correspondentes a il rsvb, não é?"

"Parece lógico", concordou Greg. "Vamos a isso?"

Tomás cravou os olhos na anotação com !il rsvb e contou a posição de cada letra no alfabeto.

"Ora, o i é a nona do princípio. A nona do fim é... uh... o r. O l é a décima segunda do princípio, o que corresponde a... a... ao o. O r dá... dá i, o s... uh... dá h, o v dá... dá e e o b remete para o... o y."

Apresentou o resultado.



!ro ihey



"O que é isto?", perguntou Greg. "Ro ihey? O que significa isso?"

O criptanalista estreitou os olhos e estudou a mensagem, intrigado.

"Realmente... uh..." gaguejou, mordendo o lábio inferior. "Não sei... não sei o que seja."

"Será uma língua estranha?"

A sugestão fez Tomás arregalar os olhos.

"Pois é óbvio que é", exclamou. "Se é um sinal do Gênesis, tem de ser em hebraico, não é?"

"E você sabe hebraico?"

"Estou a aprender", disse. "Mas já sei o suficiente para perceber que o hebraico se lê da direita para a esquerda e não da esquerda para a direita." Pegou na caneta. "Espere aí, vou pôr à nossa maneira."

Inverteu a sequência das letras.


Yehi or!



"Yehi or!", leu Greg. "O que quer dizer isso?"

Tomás empalideceu.

"Meu Deus! Meu Deus!"

"O que foi?"

"Yehi or! Não está a perceber? Yehi or!"

"Mas o que é isso?"

"See sign Gênesis. Yehi or!" Bateu com o indicador na frase rabiscada no papel. "É este o sinal do Gênesis. Yehi or!"

"Sim, mas o que significa yehi or?"

Tomás olhou para Greg e para Ariana, estupefacto, embasbacado, digerindo a enormidade do que acabara de lhe ser revelado, invadido por um tropel de imagens e sons e palavras e pensamentos que, naquele instante, como que coreografados em súbita sincronia, como uma sublime melodia que emerge da orquestra mais caótica, se encaixaram uns nos outros e extraíram da treva a verdade mais profunda.

Om.

O om primordial que criou o universo ressoou-lhe na memória pelo coro cavado dos monges tibetanos. Foi ao som penetrante do mantra fundador que se lembrou do permanente bailado de nascimento e morte, de criação e destruição, a divina coreografia incorporada na eterna dança de Shiva; e foi ainda com aquela sílaba sagrada a ecoar-lhe na mente que compreendeu o segredo da Criação, o enigma por detrás do Alfa e para além do Ômega, a equação que faz do universo o universo, o misterioso desígnio de Deus, o surpreendente objetivo da vida, o software inscrito no hardware do cosmos.

O endgame da existência.

Diante de si, rabiscada a caneta, inscrevia-se a fórmula que rompe a não-existência e tudo cria.

Tudo, incluindo o Criador.

"Tomás", insistiu o americano, impaciente, quase abanando o seu interlocutor. "O que diabo significa yehi or?"

O criptanalista olhou para ele e para Ariana, olhou-os com espanto e maravilha, olhou-os como se tivesse despertado de um longo transe e, num sopro tênue, quase temeroso, nomeou enfim a equação mágica, o enunciado a que a inteligência que se espalhar pelo universo terá um dia de recorrer para escapar ao cataclismo do fim dos tempos e começar tudo de novo.

A fórmula de Deus.

"Faça-se luz!"

O rosto de Greg permaneceu inexpressivo, como uma janela fechada que esconde o brilho do dia para lá dela, como uma tela branca que espera o pincel colorido que lhe dará vida.

"Faça-se luz?", murmurou por fim. "Não estou a perceber..."

Tomás inclinou-se para a frente, aproximando o seu rosto excitado da face opaca do americano.

"É esta a prova bíblica da existência de Deus. Faça-se luz!"

O seu interlocutor abanou a cabeça, ainda sem nada compreender.

"Desculpe, mas isso não faz qualquer sentido. Como é que esta expressão prova a existência de Deus?"

O criptanalista suspirou, impaciente.

"Ouça, Greg. A expressão em si não prova a existência de Deus. Ela tem de ser interpretada no contexto das descobertas feitas no campo da ciência, está a perceber? É essa a verdadeira razão pela qual Einstein não quis divulgar o seu manuscrito. Ele sabia que este enunciado bíblico não chegava, era necessária confirmação científica." Recostou-se no assento e arregalou os olhos, num crescente empolgamento. "Essa confirmação já surgiu. Entende? Essa confirmação já surgiu e mostra que a Bíblia, por mais incrível que pareça, encerra verdades científicas profundas. E é nesse sentido que a expressão faça-se luz! prova a existência de Deus."

"Desculpe, mas continuo sem ver essa prova. Explique lá isso melhor."

"Muito bem", exclamou Tomás, massageando o rosto com a ponta dos dedos enquanto reordenava os pensamentos. Inspirou fundo e fitou o seu interlocutor. "A Bíblia diz que o universo começou com uma explosão de luz, não é verdade? Deus disse: faça-se luz! E a luz fez-se."

"Sim."

"Einstein intuiu que este enunciado bíblico era verdadeiro. Anos depois da sua morte, a descoberta da radiação cósmica de fundo veio provar que a hipótese do Big Bang era correta. O universo nasceu de fato de uma espécie de explosão inicial, o que significa que afinal a Bíblia tinha razão: tudo começou quando a luz se fez."

"Sim."

"A questão que se coloca agora é a de determinar quem é a entidade que obrigou a luz a fazer-se."

"Está a falar de Deus..."

"Chame-lhe Deus se quiser, o nome não interessa. O que interessa é o seguinte: o universo começou com o Big Bang e vai acabar com o Big Freeze ou com o Big Crunch. Einstein suspeitava que será com o Big Crunch."

"Que é o Big Bang ao contrário."

"Exato", confirmou Tomás. Voltou a inclinar-se para a frente, irrequieto de excitação. "Agora preste atenção a isto. A revelação do Princípio Antrópico, associada à descoberta de que tudo está determinado desde o início dos tempos, demonstra que sempre houve uma intenção de criar a humanidade. O mistério é saber porquê. Por que razão se criou a humanidade? Qual o seu desígnio? Por que raio andamos aqui? Por que motivo fomos criados?"

"Mistérios insondáveis..."

"Talvez não sejam tão insondáveis quanto isso."

"O que quer você dizer? Há resposta para essas perguntas?"

"Claro que há." Acenou com a folha rabiscada, a linha yehi or! claramente visível sobre o papel. "A resposta está inscrita aqui na fórmula de Deus. Faça-se luz! Einstein concluiu que a humanidade não é o endgame do universo, mas um instrumento para se alcançar o endgame."

"Um instrumento? Não estou a entender."

"Repare na história do universo. A energia gera matéria, a matéria gera vida, a vida gera inteligência." Pausa. "E a inteligência? O que vai ela gerar?"

"Não faço a menor idéia."

"Ao identificar o faça-se luz! com a fórmula divina, Einstein foi o primeiro a responder essa pergunta."

"Ah, sim? E o que concluiu ele?"

"Deus."

"Como?"

"A inteligência gera Deus."

Greg contraiu as sobrancelhas e abanou a cabeça.

"Não sei se estou a acompanhar o seu raciocínio..."

"É muito simples", murmurou Tomás. "A humanidade foi criada para desenvolver uma inteligência ainda mais sofisticada do que a biológica. A inteligência artificial. Os computadores. Daqui a centenas de anos, os computadores serão mais inteligentes do que o homem e, dentro de milhões de anos, estarão habilitados a escapar às alterações cósmicas que ditarão o fim da vida biológica. Os seres vivos baseados no átomo de carbono não serão viáveis daqui a muitos milhões de anos, quando as condições cósmicas se alterarem, mas os seres vivos baseados noutros átomos poderão sê-lo. São os computadores. Eles vão espalhar-se pelos quatro cantos do universo e, colocados em rede daqui a milhares de milhões de anos, tornar-se-ão uma única entidade, onisciente e onipresente. Nascerá o grande computador universal. O problema é que a sua sobrevivência será ameaçada pelo Big Crunch, não é? O grande computador universal ver-se-á então colocado perante este problema: como escapar ao fim do universo? A resposta vai emergir de forma terrível." Fez uma pausa. "Não há escapatória, o fim é inexorável."

"Então acaba-se tudo."

Tomás sorriu, malicioso.

"Não exatamente. Há uma maneira de o grande computador universal garantir que voltará a existir."

O criptanalista fez uma pausa, como se quisesse criar suspense.

"Qual?", quis saber o americano.

"O grande computador universal terá de controlar ao pormenor a forma como o Big Crunch irá ocorrer. Terá de controlar tudo segundo uma fórmula que lhe permita recriar o mesmo universo depois do Big Crunch, de modo a que tudo possa voltar a existir. Tudo, incluindo ele próprio."

"Recriar tudo?"

"Sim. O grande computador universal vai desaparecer com o Big Crunch, mas, entretanto, conceberá uma fórmula que lhe permitirá reaparecer no novo universo. Essa fórmula implicará uma distribuição da energia com um rigor e afinação tais que, evoluindo depois de modo determinista segundo leis e constantes com valores devidamente definidos, permitirá que reapareça no novo universo a matéria, depois a vida e finalmente a inteligência, aplicando assim de novo o Princípio Antrópico."

"E que fórmula será essa?"

Tomás encolheu os ombros.

"Não sabemos, é algo de tão complexo que só uma superinteligência a poderá conceber. Mas a fórmula vai existir e a sua concepção está metaforicamente inscrita na Bíblia."

"Faça-se luz!", sussurrou Greg, os olhos azuis cintilando.

"Nem mais." Tomás sorriu. "Faça-se luz!" Inclinou a cabeça. "A fórmula de Deus."

"Espere um momento", cortou o americano, erguendo as mãos como quem pede um intervalo. "Você está a insinuar que Deus é um computador?"

"Toda a inteligência é computadorizada", devolveu o criptanalista num tom condescendente. "Isso foi uma coisa que eu aprendi com os físicos e os matemáticos." Bateu com o dedo na testa. "Inteligência é computação. Os seres humanos, por exemplo, são uma espécie de computadores biológicos. Uma formiga é um computador biológico simples, nós somos mais complexos. Só isso."

"Essa definição parece-me um pouco forte..."

Tomás encolheu os ombros.

"Ouça, se isso o incomoda não lhe chamemos grande computador universal, está bem? Chamemos-lhe... sei lá, chamemos-lhe... uh... inteligência criadora, grande arquiteto, entidade superior, o que você quiser. Não interessa o nome. O que interessa é que é essa inteligência que está na raiz de tudo."

"Estou a ver."

"Einstein concluiu que o universo existe para criar a inteligência que irá gerar o próximo universo. É esse o software do universo, é esse o endgame da existência. Faça-se luz! é a metáfora bíblica para a fórmula da criação do universo, a fórmula que o grande computador universal irá enunciar quando ocorrer o Big Crunch, a fórmula que provocará um novo Big Bang e tudo irá recriar. Tudo, incluindo Deus. O objetivo último do universo é recriar Deus e nós não passamos de um instrumento desse ato."

Os olhos do americano dançaram entre Tomás e Ariana. Olhou para o rascunho que o criptanalista segurava com intensidade entre os dedos e compreendeu enfim o derradeiro segredo de Einstein — a revelação da existência de Deus, do propósito do universo, do desígnio da humanidade.

"Isso é... é incrível."

Tomás não respondeu. Abriu a porta do carro e espreitou para a rua. Já não chovia; uma aragem fresca acariciou-lhe o rosto, era leve e pura, quase perfumada de tão límpida. Pequenas poças de água espalhavam-se pelo passeio e pela estrada, cristalinas, refletindo como espelhos o céu denso, era como se a chuva tudo tivesse lavado. A manhã pintava-se de azul, serena e melancólica, respirando ao ritmo das bátegas de água que pingavam grossas das folhas e tombavam no solo húmido com estalidos molhados, quase musicais. A luz do sol espraiava-se com bonomia, filtrada suavemente pelas nuvens que se afastavam lá em cima, umas carregadas e pachorrentas, outras pálidas e ligeiras.

O historiador endireitou-se cá fora, deu a mão a Ariana e ajudou-a a sair. Os seguranças americanos, que se tinham refugiado por baixo de um carvalho frondoso e ainda lacrimejante, aproximaram-se e interrogaram Greg com os olhos, como se pedissem instruções. O adido fez-lhes um sinal silencioso com a cabeça, estava tudo bem, e os homens descontraíram.

Antes de se afastar, Tomás voltou-se para a porta da limusina e encarou Greg uma derradeira vez.

"É estranho como durante tanto tempo a humanidade em geral intuiu a verdade intrínseca por detrás do universo", comentou. "Já reparou nisso?"

"O que quer você dizer?"

"Antes de morrer, o meu pai contou-me que os hindus consideram que tudo é cíclico. O universo nasce, vive, morre, entra na não-existência e volta a nascer, num ciclo infinito, num eterno retorno a que chamam a noite e o dia de Brahman. A história hindu da criação do mundo é a do ato pelo qual Deus se torna o mundo, o qual se torna Deus."

"Espantoso."

Tomás sorriu.

"É, não é?" Respirou fundo. "Ele recitou-me também um interessante aforismo de Lao Tzu, um poema taoísta que encerra o segredo do universo. Quer ouvir?"

“Sim.”

Um súbito sopro de vento agitou os carvalhos, agreste e violento, arrancando folhas e vergastando os vultos sombrios que rodeavam a limusina molhada. Parecia agora que o céu uivava, ululando de modo quase sinistro, como se tentasse romper a doce brandura que se instalara depois da chuva, como se ameaçasse desencadear um novo e punitivo dilúvio, como se clamasse vingança por ver arrancado ali o seu mistério mais profundo.

Mas Tomás não se intimidou e recitou o poema como se ainda o escutasse dos lábios trêmulos do pai; recitou-o com fervor, com paixão, com a intensidade de quem sabe que encontrou o caminho e que percorrê-lo é o seu destino.


"No fim do silêncio está a resposta,
No fim dos nossos dias está a morte.
No fim da nossa vida, um novo início."


Um novo início.


Texto extraído do livro "A fórmula de Deus", escrito por José Rodrigues dos Santos, editora Record, 2008.